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PERCURSO ACADÉMICO E VIVENCIAL – (Introspecção)

É tempo de despedir-mo-nos de RA,  Apolo e Febo, assim como de Baco e Dionísio, deuses grego e romano da pândega. 
Por outras palavras, as férias de verão terminaram… Não tarda nada e Persefone irá fazer a sua estadia no Hades. Tal é sinónimo de Outono-Inverno. Mas não se preocupem, porque Atlas continua a sustentar o Mundo.
Este é o pano de fundo que marca o reencontro com Toth ou, para quem preferir, com Minerva e Nabu, contexto atinente ao começo de um novo ano escolar ou académico que, à partida, sucita diferentes expectativas e motivações tanto a docentes como discentes, consoante a faixa etária e domínios disciplinares…

Já há algum tempo que trato o deus Toth e a deusa Minerva por tu. Com efeito já levo um quartel de século nos seus meandros.
Tal começou não há muito tempo e não muito longe na minha memória, aos três anos de idade com a ida para o Infantário. Foi o primeiro marco da minha vida nas dependências académicas e que me fez compreender que para além do padroeiro Toth e padroeira Minerva, a vida e quotidiano escolar era feita de convivência entre géneros e sexos. É a época de desenvolver reflexos, percepções, sensibilidades e a curiosidade. É uma primavera de descobertas: o nome das coisas, das cores, aprender as primeiras letras e números. Posso dizer que desde tenra idade sempre achei as letras mais coloridas que os números afigurando-se bastante cinzentos. Eu como "infante" aprendi formas de comportamento e convivência essenciais para a vida entre as quais perguntar às meninas o nome e a idade. 

Passado o infantário entra-se na fase pueril da Primária. Com 5 anos de idade ingressa-se no 1.º ano de escolaridade… Toth e Minerva são esquecidos e as meninas são relegadas para 2.º plano. Os heróis e referências passam a ser outros, assim como o universo. Já não se está confinado ao claustro da sala de aula, mas o que interessa aos rapazinhos é o recreio e nesse sobressai o campo de futebol… A fantasia invade a imaginação que eiva símbolos e super heróis da BD – como o Super Homem – e os craques da bola, sendo que na altura eram famosos Maradona, M. Van Basten, Ruud Gullit, F. Reijkard, L. Matthaus, J. Klinsman, A. Möller, D. Bergkamp, M. Laudrup, R. Koeman, G. F. Zola, Vialli, Ravanelli, Mancini, Roberto Baggio, Maldini, Davor Suker, Mijatovic, F. Redondo, I. Zamorano, P. Futre, F. Gomes, Stoichkov, Gica Hagi, Romário, Eric Cantona, David Ginola, Peter Schemeichel, O. Kahn, Goikoetxea, Peruzzi, Marchegiani… Era este o mundo e imaginário que alimentava as traquinices, jogos e brincadeiras. De resto os relatórios da professora aos pais falam por si, sendo que ainda sou do tempo da reguada. "... hiperactivo, acaba os trabalhos primeiro que os colegas e em seguida distrai-os." Devo de dizer que tal característica manteve-se ao longo de toda a minha vida.

O ciclo preparatório – 5.º e 6.º anos – significa a reconciliação com Toth e Minerva, que agora são conciliados com as traquinices, brincadeiras e jogos. As meninas esquecidas na fase anterior já começam a merecer aceitação e a ter lugar nas brincadeiras dos rapazes. Os pais e os familiares consoante os resultados académicos e dotes e habilidades dos filhotes divertem-se a vaticinar e projectar cientistas, arquitectos, médicos. Mas ainda é precoce e muito cedo para isso. A mente pueril não é tão ambiciosa. Por enquanto sonha-se em ser-se jogador de futebol. No meu caso para além disso quis ser bombeiro e tinha a ideia mirabulante de ser lixeiro só para poder andar empoleirado nos camiões de recolha.

No ensino básico – actualmente denominado de unificado, 7.º a 9.º anos – comecei a demonstrar capacidades inatas para a História… Os números continuavam a parecer-me demasiado cinzentos… Comecei a sonhar com pirâmides, zigurates, parthenon, templos, igrejas, catedrais, e todo o tipo de ruínas edificavam e educavam o meu olhar que com acuidade sorvia, deleitava-se e fruía a observar e analisar diferentes estilos e ordens arquitectónicas. Apaixonei-me pelo Gótico em todas as suas diferentes formas, fases e origens. Maravilhei-me com a arte e megalomania da Civilização Egípcia. Novos heróis surgiam. Desta vez provinham do cinema e dos vídeo-jogos. Indiana Jones e Tomb Raider (aka Lara Croft) faziam borbulhar a minha mente para a descoberta da História mas ainda não houvera descoberto a sua Musa, Clio.

Mas a clepsidra não pára e Saturno não cessa de girar. No 9.º ano tinha um perfil académico-social vincado: colérico e fleumático e com apetências para a História, Geografia, Ciências Naturais e Físico-Química. Qual seria a minha decisão e passos seguintes? A dúvida de Wilhelm Dilthey pairava. Ciências Humanas e Sociais ou Ciências Naturais? Um factor acabou por tornar a decisão evidente… A matemática continuava a parecer-me demasiado cinzenta e desinteressante… Portugal nunca foi um país de e para matemáticos. Com excepção de Pedro Nunes (séc. XVI) fomos sempre mais virados para as letras: Gil Vicente, L. V. de Camões, Garcia de Resende, Bocage, Almeida Garrett, Eça de Queirós, Fernando Pessoa, Almada Negreiros, António Lobo Antunes et. al.
Tal como não era pais para matemáticos também nunca o foi para filósofos a não ser os endoutrinadores eclesiásticos como foi o caso de Padre António Vieira. Poderíamos gabar-nos de ter um filósofo e matemático com largo espectro e influência no eclodir e desenvolvimento do racionalismo e do pensamento hipotético-dedutivo, experiencialismo ou método científico. Na altura não se podia naturalizar pessoas que elevassem o nome do país como é o caso dos jogadores de futebol e atletas olímpicos dos dias de hoje. Foi pena. Falo de Espinoza…

Mas voltemos à minha decisão: Cientista ou Humanista? Hérodoto ou Hipócrates? No panorama nacional, Pedro Nunes ou Alexandre Herculano? Indiana Jones ou A. Einstein?

No limiar do séc. XXI, ingressei no secundário e tínhamos Humanista. A descoberta de Clío começava mas ainda não a conseguira desnudar. Sofia (Filosofia) despertava-me atracção. Fiquei dividido entre Clio e Sofia. Mas para além disso, a disputar a minha atenção para com Clio e Sofia estavam os idílios e paixões platónicas – ou tal e qual Eloisa e Abelardo; Emílio e Sofia – que então afloravam e o desejo intenso de viver e conviver embalados e inspirados pelas melodias e lyrics das músicas dos Queen. Mas Clio triunfou.

Já no decorrer da 1.ª década do séc. XXI, penetrei no Ensino Superior, oferecendo-me como aprendiz do méthier d’historien, adorador e alcolita de Clio… Contudo na Faculdade de Letras cedo descobri que não eram só as letras que eram coloridas mas as amizades ganhavam novos tons. Descobri que Cupido, Eros, Afrodite, Vénus e Allatu tinham o seu lugar e ocupavam-me o tempo e espaço. Baco e Dionísio para quem apreciava também irrigavam e jorravam e era como se existisse na faculdade e nos momentos de celebração e maior euforia (Cortejo e Queima das Fitas) uma fonte ou lago alcalino e cidrico onde todos desejavam banhar-se…
O meu perfil psico-técnico do Secundário orientava-me para a filosofia, sociologia, diplomacia e psicologia. Acho que ao escolher ser Historiador consigo combinar e reunir um pouco de todas essas competências…
 
Na Licenciatura despi e desflorei Clio e ela prometeu fazer de mim um Homem. Em dia de exames a noite era de festa. Alcolitas e oráculos de Clio, isto é, amigos e amigas juntavam-se para celebrar... O cursus honorum prosseguiu. Apaixonei-me pela Dark Age, assim como pelo Al-Andaluz (Andaluzia) que foi local de peregrinação no 2.º ano de licenciatura com as visitas às cidades de Sevilha, Granada e Córdoba. Na faculdade aprendi que a História não era um saber enciclopédico ou de cultura geral tal e qual como era por vezes lecionada no Secundário, e na qual autores como Dan Brown especulam e firmam a sua ficção de romances ditos "históricos" sem o serem.

Platão, Aristóteles, Descartes, Nietsczhe foram esquecidos e trocados por revistas cientificas como a FHM, Maxmen, Maxim, entre outras… Agora mais a sério, cada ano de Licenciatura ficou marcado por um livro, música ou uma ou mais leituras/músicas. O 1.º ano ficou marcado por H.I. Marrou – Do Conhecimento Histórico. O 2.º foi vivido ao sabor do desfolhar de Picture of Dorian Gray (O.Wilde). Deleitei-me ainda com Tolkien e com os filmes da trilogia de O Senhor dos Anéis que aos meus olhos pareciam um documentário Medieval feito por Jacques Le Goff e Georges Duby. O meu gosto pela Dark Age e pela mitologia céltica ou asgardiana, norte europeia, predispôs a minha atenção e despertou o meu interesse musical para grupos como HIM, Nightwish, Within Temptation e numa versão mais pop e soft desse tipo de melodias, The Cranberries. Mantive sempre o gosto por Queen. Tal levou-me a encontrar novas bandas que começaram por os emular e mimitizar, à cabeça MUSE cujo o álbum Absolution constitui precisamente uma ópera rock estilo Queen. Mais tarde outras bandas emergentes seguiram-lhe em parte as pisadas como é o caso de My Chemical Romance. O facto das músicas dos Queen plasmarem um sincretismo musical fez-me tornar fã de Likin Park que consagra num estilo próprio três tipos de música, constituindo a fusão de Techno, Electro e Rock. No 3.º ano eclodiu o interesse por autores como Giovanni Picollo della Mirandolla – Discurso Sobre a Dignidade do Homem –, assim como pela lógica fria e calculista de Nicolau Maquiavel – O Príncipe – e a obscenidade e deboche de François Rabelais. O 4.º ano marcou o reencontro com Nietsczhe e muitos autores do ultra-romantismo com destaque para Dostoiévskiy, enriquecendo a verborreia e completando a personalidade na sua vertente lírica. No ano de estágio didáctico-pedagógico precisava de rir e por isso virei-me para a BD: Astérix entre outras… Ao longo de 5 anos a convivência avec les femmes et demoiselles despertou e abriu os meus sentidos e percepções para a House Music, sendo os meus DJ favoritos Bob Sinclar e Roger Sanchez. Apesar dessa primazia nunca esqueço a cover que Pete da Zouk fez da música Roads de Portishead que sempre me encheu o espírito e serviu de talismã. Claro que o clássico de Joe Cocker cujo refrão por demais conhecido – You Can Leave Your Hat On – também era uma melodia assiduamente ouvida e coreografada.

Mas Clepsidra e Saturno não cessam o seu ciclo. Seguiu-se o Curso de Especialização em Ensino da História… Senti que Clio me abandonara e que me faria passar por um ano purgatório… Não tenho muito a dizer nem a relatar sobre esse período…
Após esse ano de provação, tal e qual como anacoreta e eremita estive retirado para reflexão e ascese, longe do quotidiano académico. Por fim decidi que vou subir ao altar e desposar Clio, o que equivale a dizer que estou na qualidade de seu sacerdote (Historiador) a fazer investigação no âmbito do Curso de Doutoramento em História. Não sei se a minha futura tese chega para edificar um templo para Clio. Mas se conseguir construir ou elaborar uma peça de joalharia, um simples adorno ou até mesmo erigir um pequeno altar já seria bom. Tudo depende da avaliação austera dos Gerontes, Estrategas e Arcontes muito dados à sobranceria, soberba, ambiente hierático e protocolo, no momento de comparecer perante o Areópago Académico em disputatio da minha sapiência. Resta saber se me sair a fava espartana e jónica ou a sorte ateniense e dórica?

Nos últimos tempos ecoa na minha mente a música Under Pressure interpretada por Freddy Mercury e D. Bowie. Com efeito no meu "fórum" de investigação é frequente ter de me dirigir a Bibliotecas e Arquivos. Nessas locais lamentavelmente caiem e queimam-se as minhas pestanas. Certa vez a desfolhar um jornal vi a História a desfazer-se à minha frente, pois quando estava a virar certa página do periódico ela simplesmente evaporou-se (ups). Começo a achar que também tenho de ser cirurgião. Com efeito tenho de começar a usar luvas e a manusear com cuidado todos os documentos antigos de modo a que esses não se desfaçam e por outro lado acho que vou começar a usar uma máscara para evitar o pó secular que acompanha e decora esses mesmos documentos de modo a não ser inalado. Não é que não deseje respirar a História! Um relato digno de nota deu-se quando me desloquei ao Arquivo para consultar Actas de Vereação para um determinado período histórico. A Dr.ª com um sorriso escarnecedor e brincalhão nos lábios disse: «São 90 Livros!». De repente veio à minha memória o incêndio colossal da Biblioteca de Alexandria.

Em conclusão, quero desde já desejar um bom ano escolar e académico a todos os docentes e discentes quer a nível pedagógico, científico e social. Eu como sacerdote de Clio acredito que o meu train de vie, assim como a maneira pela qual analiso e compreendo as sociedades e o mundo passa pela História. Uma última nota. No 8.º ano de escolaridade certa professora explicava os diferentes graus académicos e quando se referiu ao mais elevado adjectivando-o de difícil de obter e atingir, só ao alcance de alguns, o meu colega de carteira vaticinou quase como presságio que eu chegaria lá. Isso foi aos 13 anos, hoje uma dezena de anos volvida tudo indica que sim, que lograrei alcançar essa meta.

CA

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