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THE YOUNG POPE – Jude Law; Final da Mini-Série


[Spoiler Alert] The Young Pope, a mini-série ficcional sobre o pontificado controverso de Lenny Belardo aka Pio XIII, o 1.º Papa norte-americano e o mais jovem de sempre, protagonizado pelo ator famoso Jude Law. Exclusivo do TVSéries em Portugal, o último episódio será transmitido a 8 de janeiro. Na realidade sabe a pouco. Direcionada ao público alvo maduro, sem dúvida que fica a dever pelo menos mais uma temporada.

The Young Pope adota a mordacidade da sátira romana ou as feições humanistas da comicidade moralizante do teatro vicentino. Personifica a crítica social e de costumes sobre o clero, bem como sobre a direção eclesiástica e política da Igreja Católica, penetrando no quotidiano e nas mentalidades da Cúria Romana.  
Retrata na forma de drama exuberante a esquizofrenia entre espiritualidade e mundanidade. Serve-se de personagens tipo que protagonizam diálogos e atitudes tão hilariantes quanto destrutivas.

Além de Pio XIII, destaque para o Secretário de Estado da Santa Sé, cardeal Voiello interpretado a preceito por Silvio Orlando , personalidade bipolar tanto lubrica como altruísta. 
Burocrata e político da Igreja Romana, Voiello revisita a figura medieval do "Kingmaker", interessado em ser o poder por detrás do trono de S. Pedro
Fanático adepto de futebol, tifosi acérrimo do Nápoles, devoto a Diego Armando Maradona, cuidador noturno de um deficiente profundo, vive no luxo do seu palacete e demonstra sentimentos amorosos carnais em relação à irmã Maria (Diane Keaton).

Jude Law é a alma deste The Young Pope controverso, dotado de atitudes egocêntricas, tiques magalómanos ou narcisistas, e de uma forma de ser arrogante, intransigente e vingativa, contrastante, por vezes, com traços temperamentais humildes e a simplicidade própria de um mero pregador evangélico, conforme sugere o seu discurso direto capaz da petulância de afirmar "My only sin, and it's an enormous one, is that my conscience does not accuse me of anything", ou de inspirar a congregação através do pensamento "We are all guilty. We are all guilty of war and death. Always. In the same way, we can all be guilty of peace. Always."
Mais. A sua personalidade desconcertante alimenta suspeições de que o Conclave conseguiu o cúmulo de eleger um Papa ateu.  
Idiossincrático, o pontificado de Lenny Belardo embala ao som da Pop, do Rock, da Techno, conforme demonstra o tema de abertura e a impressão geral deixada suscitada pela banda sonora catalisadora da vertigem entre a liturgia e a profanidade.  


O pontificado de Pio XIII tem a pretensão de ser revolucionário. Promove a síntese Hegeliana entre o Catolicismo e o Protestantismo, entre a Reforma e a Contra-Reforma. Aponta a ideais elevados tais como, a fé e a sola scriptura de Martinho Lutero, o Humanismo Cristão de Érasmo de Roterdão, mas também procura a opulência dos pontificados mais faustosos como por ex., Alexandre VI (Bórgia). Lenny exige um salão destinado somente a receber os presentes que lhe são ofertados, entre os quais um canguru que, de modo insólito, se passeia pelos jardins do Vaticano.
Porventura busca a pureza original da Igreja primitiva ou o tom hierático e a solenidade moral da Patrística, no intuito de purificar o clero, varrer a hipocrisia, a começar pelo Colégio de Cardeais submetidos à total obediência ao Santo Padre e à exclusividade do trabalho em prol da Santa Madre Igreja.  

Lenny Belardo vê-se na imagem de um soberano fascinado pelos tempos da Teocracia, do Dictactus Papae, da infalibilidade papal, empenhado em restituir à Igreja o poder espiritual e temporal, até mesmo os "poderes" mais nefastos da excomunhão, do anatema, entre outras formas de ostracismo.
Pio XIII sonega a imagem do Papa à devoção dos crentes, prega na penumbra ou de costas, renega toda e qualquer forma de exibicionismo, defende o cristocentrismo, fecha a Igreja sobre si própria, oculta-a para a tornar desejável, o "fruto proibido", promove a religião e a devoção apenas para os fiéis absolutos, sem negociar ou ceder em relação a máximas teológicas e morais. Em certa medida, vê o fanatismo católico com bons olhos.
Mais. Esse é o teor das ordens que transmite à "diretora de marketing" Sofia interpretada pela bela Cécile de France que coordena a exploração dos "direitos de imagem" do Papa e do Vaticano como se fosse uma multinacional de homilias e orações. Algo iconoclasta, Pio XIII manda retirar a efígie Papal de todo e qualquer souvenir.
O calcanhar de Aquiles de Lenny Belardo radica na sua infância, por não se conseguir libertar do complexo orfandade ou de abandono pelos seus pais hippies! A figura maternal que conhece é a da Irmã Maria (Diane Keaton), a qual o acolheu num orfanato eclesiástico. Pio XIII, a título provocatório, mas também afetivo, nomeia-a como conselheira pessoal.


A mini-série aborda temas tabus: pedofilia, homossexualidade, bissexualidade, simonia, nepotismo, venalidade, nicolaismo, ordenação feminina, aborto etc... Pio XIII é um Papa purista disposto a chutar para fora da Igreja todas essas "perversões" nem que para isso esvazie a congregação.

No meio do ambiente sagaz e surreal, Young Pope dota a personagem de Jude Law com o dom rogatório sincero, persistente e miraculoso, capaz de conceder um filho a um casal infértil, mas também de "punir" a Irmã Antónia pelas suas más ações na gestão de uma das aldeias da boa vontade em África. 
The Young Pope redunda numa intriga palaciana pós-moderna no seio da Santa Sé, criada e encenada pelo realizador italiano galardoado Paolo Sorrentino. Mas para lá das poderosas contendas pelo poder entre Lenny, o seu mentor Cardeal Spencer (James Cromwell) e o Cardel Voiello, a mini-série termina com a simplicidade de uma epístola Paulina. 
Cai a arrogância e traços mais narcisistas de Lenny Belardo reconciliado e respeitado pelo seu clero. Na homilia em que finalmente dá a conhecer a sua imagem aos fiéis, realizada na icónica Praça de S. Marcos, de Veneza, Lenny resume o ideal de vida cristão no Amor e nos Sorrisos. The End.

CA

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