Avançar para o conteúdo principal

SOBRE O EFÉMERO... – (Reflexão)

O efémero vive! Nas nossas acções, atitudes e comportamentos perpetuamos-lo. É uma nova forma de espiritualidade e até de religiosidade. 
Não se trata de uma novidade absoluta. Friedrich Nietsczhe em opúsculos como A Origem da Tragédia e Assim Falava Zaratustra anunciou o primado da estética sobre a ética. Mais. Que nas gerações vindouras os valores éticos seriam praticados e determinados pela estética. Dorian Gray no universo literário ficcional viveu e consubstanciou essa axiologia até aos seus extremos. Poder-se-ia ainda identificar neste apelo que o efémero induz um legado helénico. Com efeito, a atracção por aquilo que é belo – além do espaço que ocupa na arte – foi um dos axiomas da filosofia pré-socrática, socrática e aristotélica que tinha por metas a ascensão dialéctica a grandes valores personificados na Verdade, no Bem e no Belo.
Contudo, a realidade demonstra que estamos perante um fenómeno mundial. Efeitos disseminadores da Globalização? Exportação do American Way of Life? Revivalismos dos Loucos Anos 20? Motivações geradas por factores instrinsecos à psicologia de cada individuo e sociabilidades que influenciam perfis comportamentais? Capacidade fustigadora de hábitos de consumo e modas das indústrias cosmética, vestuário e boticária?

No dizer de Benjamin Franklin: «Quem se apaixona por si mesmo não tem rivais.». O gosto em ter uma boa imagem sempre foi um denominador comum ao longo da História em diferentes civilizações. A diferença em relação à actualidade reside no facto dessa perspectiva não se fixar no plano exclusivamente monista mas situar-se numa cosmovisão dialéctica. Mens sana in corpore sano. É o aforismo que melhor a define. Mente e corpo em equilíbrio permanente. É nesse processo do dosear desse equilíbrio que nasce a personalidade. Mulher que se preocupe apenas com a sua imagem não passa de pirosa! De igual modo, Homem que só se preocupe com a sua imagem deixa de ser Homem e passa a ser comentário!

O efémero incorpora a modelação do nosso auto-conceito e auto-imagem. Todos partilhamos um pouco desse lado frugal e comezinho da nossa existência. Ele faz parte da nossa sublimação. Em graus e refinamentos diferentes todos buscamos alguma espécie de conforto na imagem. É importante apurarmos a nossa forma física, bem como ter brio e aprumo.  Hoje em dia até do ponto de vista profissional de acordo com o modelo do "Professional Approach" somos formados a ter uma imagem condizente com a função e interacção que desempenhamos. O impacto que a denominada 1.ª impressão produz pode ser decisivo na demanda por emprego e trabalho, na condução de um negócio ou angariação de clientela. Mas não podemos esquecer-nos que esse patamar impressionista terá de ser sustentado na demonstração cumulativa de capacidades e competências. 

Além do efémero e apesar do consolo imediato e instrumental que a imagem vincula, no desenvolvimento do self é de extrema importância investir na psique. No dizer de Gilles Lipovetsky em A Era do Vazio a aprendizagem do strip-tease psicológico deveria integrar a nossa personalidade. Sem este plano dialéctico a maior parte das pessoas assemelha-se à lua porque não produzem brilho próprio.«Estamos todos na sarjeta, mas alguns de nós olham para as estrelas.» (Óscar Wilde).
Por mais cosmética, saltos altos, tintas Barbot e CIN despejadas no rosto convertendo a fronte em fronha carnavalesca, para produzir brilho próprio é necessário conjugar imagem com personalidade. É de uma menor idade ultrajante fixarmos-nos apenas na holografia, em arranjarmos-nos e produzirmos-nos como produtos numa prateleira. De igual modo são de evitar as compulsões obsessivas e os tiques metro-sexuais com a nossa imagem.

É certo que a curto prazo é mais fácil obter resultados práticos fazendo exploração da imagem do que investir na complementaridade entre imagem e personalidade. Essa estratégia não é novidade. Ditadores usaram-na, a mitologia enveredou pela consumação iconográfica. Até santos e santas tem imagem. Contudo, devemos ter sempre presente que L'éphémère vive mais ne reste pas!

CA

Comentários

Mensagens populares deste blogue

THE BREAKER – Little Big Town

Little Big Town , sinónimo de pura melodia, acústica exuberante e harmonia entusiasta, características musicais simples – difíceis de criar ou alcançar – correspondentes ao estilo de som despretensioso, quase de cariz artesanal, pautado pelo equilíbrio e polivalência rítmica, atributos que transformam o cantar em autêntico carrossel existencial, animado pela dinâmica intrínseca à lucidez dos acordes, ao movimento e reciprocidade transmitidos nas vozes, pel o pulsar vitalista da percussão a par da vibração anímica do contrabaixo, pela prosa espontânea e nostálgica sugerida no tom das guitarras. As interpretações rubricadas por Little Big Town (LBT) sublimam a vida, imprimem motivações ao quotidiano, glorificam as perceções afetivas, aprimoram a inteligência emocional, divertem ou aconchegam os sentidos, apelam à genuinidade das amizades e, sobretudo, à candura dos relacionamentos amorosos, valências antropológicas na forma de canções que sustentam a asser

TABOO – Tom Hardy

Taboo – estreia em televisão, desde 7 de janeiro – representa o drama de época de estilo gótico sobre a luta de James Keziah Delaney contra os interesses da Coroa Inglesa – sob a regência e posteriormente reinado de Jorge IV – retratada enquanto império comercial ultramarino prepotente, através da atividade da Companhia Inglesa das Índias Orientais, no início do séc. XIX.  A mini-série é protagonizado pelo ator Tom Hardy, mais conhecido por interpretar o malfeitor Bane, no filme da trilogia Batman, The Dark Knight Rises (2012) . P roduzida e transmitida pela BBC, no Reino Unido, e difundida pela FOX, nos EUA , c onta com o realizador Ridley Scott entre os produtores executivos. Taboo oferece dilemas morais de personalidades controversas enquadradas no ambiente histórico sombrio que equipara a East India Company a uma multinacional oportunista, tentacular e sanguinária, a qu al subjuga e exerce domínio comercial e militar mundiais, através de amplas redes de espionag

ALMOST 40 - Reflexão

Ser quase quarentão é assim mesmo, meio na ternura, meio na dureza! O proto quadragenário vive oxímoro. A sua realidade é tanto melíflua quanto frívola, o equilíbrio perfeito entre olhos e barriga! Aparentemente blasé , o quarentão to be experimenta, sensualiza e entrega-se de corpo e alma às antinomias da paixão, desde a platónica à vanilla e hardcore .  No seu etos e apetites noir , busca temperos certos, frui momentos picantes, alinha tanto nas tapas como nos beijos, mas sabe que nem tudo é banquete, alguns sabores não valem mordiscar, são indigestos!  No seu arco de personagem, o vetero trintão escolhe ritmos, vibrações, evita tédio, aprimora o fade in e fade out . Desinibido, deprecia quer a aparência, quer a essência. Vívido, nem quantifica, nem qualifica, procura e acrescenta valor! Intimista, declina a labilidade dos grupos, amizades e colegas, enfoca a autodeterminação a par da cumplicidade interpessoal. Descomplexado, degusta o swirl de mixed emotions oferecido pelas viv